sexta-feira, 12 de fevereiro de 2010

A ATIVIDADE CIENTIFICA DA MEDICINA DA UFC NOS ANOS SETENTA

Quando a nossa turma ingressou na Universidade Federal do Ceará (UFC), em janeiro de 1972, a atividade científica dessa instituição ainda não estava consolidada e era pouco disseminada em muitos setores acadêmicos ou cursos, não divergindo, nesse tocante, do que acontecia na maioria das universidades nordestinas, naquele período.
No campus do Porangabuçu, onde se concentravam os cursos da área de saúde da UFC e funcionavam o Hospital das Clínicas, posteriormente denominado Hospital Universitário Walter Cantídio, e a Maternidade Escola Assis Chateaubriand, a pesquisa científica era esparsa, assistemática e exercida por alguns valorosos docentes, dentre os mais vocacionados para as funções de pesquisador, a exemplo de: Antônio Lacerda Machado, Dalgimar Beserra de Menezes, Joaquim Eduardo de Alencar, José Murilo de Carvalho Martins, Manassés Claudino Fonteles e Paulo Marcelo Martins Rodrigues, que foram dignificados, pela Turma de Medicina 1977.2, com a “Homenagem ao Espírito Científico”. Não havia pós-graduação stricto sensu e os cursos de especialização eram eventuais, de acordo com a oportunidade da oferta.
A ausência de programas de Mestrado e de Doutorado, direcionados ao curso de Medicina, e, ainda, a falta de incentivos para que os professores pudessem prosperar na carreira docente, concorriam para manter a pesquisa médica em baixos patamares científicos, salvo por honrosas exceções daqueles que ousavam desbravar a seara da ciência, insistindo em pesquisar e em publicar, quando não, sujeitando-se a prestar concursos de livre-docência, ou para a cátedra.
Era natural que a carência de uma estrutura de pós-graduação na Medicina, de então, resultasse na incipiência da produção científica, com reflexo direto no despertar de vocações ou de interesse para a pesquisa entre os acadêmicos, que, invariavelmente, estavam sobrecarregados com os estudos disciplinares e divididos em estágios extracurriculares, na incessante busca de auferir uma prática médica que facilitasse a futura inserção profissional.
As monitorias eram em número restrito, bem como inexistiam programas de iniciação científica, com bolsas concedidas pela própria UFC, nos moldes do PIBIC, ou patrocinadas por instituição local de fomento à pesquisa; cabiam ao CNPq, anteriormente intitulado Conselho Nacional de Pesquisas, as raríssimas concessões de bolsas de iniciação científica, na dependência da apresentação de um bom projeto de pesquisa, ancorado em um consistente currículo do orientador. Alguns professores esforçavam-se, todavia, para obter em instituições locais, públicas ou privadas, incluindo fundações, apoio financeiro que pudesse ser convertido em ajuda de custo a estudantes que se prestavam a auxiliá-los na feitura de pesquisas.
Como a Residência Médica não era um imperativo maior, para o exercício da Medicina, e o acesso a essa modalidade de treinamento, sequer valorizava a produção científica do candidato, não havia sido enraizada entre os estudantes, a busca do preenchimento desse requisito, tampouco existiam motivação ou determinação capazes de gerar a publicação de artigos científicos. No entanto, a realização anual dos Encontros Científicos de Estudantes de Medicina (ECEM) mobilizava os alunos para angariar fundos necessários à participação nesses eventos, incluindo despesas de viagem, e preparo de trabalhos, por vezes submetidos a uma jornada prévia, de feição cearense, denominada Jornada Científica de Estudantes de Medicina (JOCEME) como “avant-première” da apresentação posterior, em âmbito nacional.
Nossa turma, a dos graduados de dezembro de 1977, esteve bem representada nos ECEM-Brasil, e em outros congressos médicos, com a exposição de temas-livres, por vários dos nossos colegas, que, individual ou coletivamente, levaram trabalhos elaborados no Ceará, ombreando-se aos dos acadêmicos das demais escolas médicas do país. A lamentar, expia-se aqui a falta de artigos publicados em periódicos científicos, bem de acordo com o padrão daquele tempo.
É oportuno ressaltar que somente na segunda metade da década de 1970, ocorreram duas iniciativas propulsoras e irradiadoras da pesquisa médica na UFC; a primeira referente à criação do Mestrado em Farmacologia, sob a liderança do Prof. Dr. Manassés Claudino Fonteles, e a segunda, alusiva à implantação do Núcleo de Medicina Tropical, capitaneado pelo Prof. Dr. Joaquim Eduardo de Alencar, no bojo do Acordo de Cooperação Técnica da UFC com a Universidade de Paris.
Marcelo Gurgel Carlos da Silva
Médico graduado pela UFC em 1977

* Publicado In: Revista Histórias da Saúde. Novembro a dezembro de 2009 – ano XI, n. 21, p.12.

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