domingo, 31 de outubro de 2010

O BRASIL ANEDÓTICO XX

DOIDO... COM JUÍZO
Moreira de Azevedo - "Mosaico Brasileiro", pág. 28.O Marquês do Lavradio, que tanto fez como vice-rei, pelo asseio da cidade, era, como se sabe, indiscretamente dado às aventuras amorosas. Por esse tempo, havia no Rio de Janeiro um doido, tipo popular, de nome Romualdo, famoso pelo modo desabusado por que tratava toda a gente.
Encontrando-o uma vez, o vice-rei perguntou-lhe, de bom-humor:
- Então, Romualdo, que dizem por aí de mim?
- Dizem que V. Excia. limpa as ruas mas suja as casas! - respondeu-lhe o aluado.
E foi saindo.
AS RAPADURAS
Anedota colhida no Ceará.Andava Caio Prado, então presidente da província, pelo interior do Ceará, quando viu, à porta do mercado, em Granja, um tropeiro, que vendia a um comerciante uma carga de rapaduras.
- Dou-lhe por doze mil réis! - dizia o vendedor. - E é dado; porque eu estou comprando, na Serra Grande, a quatorze e até a quinze.
Ante aquela transação, o presidente voltou-se para Justiniano de Serpa, seu secretário:
- Que negócio é esse? Ele compra a quatorze na Serra, e vende a doze, aqui... Qual é o lucro?
- É grande, Excelência! - fez Serpa.
E rindo:
- É que ele, lá, compra fiado; e aqui, vende a dinheiro!
OS BONS VERSOS
Humberto de Campos - Discurso na Academia Brasileira de Letras, a 8 de maio de 1920.
Em uma roda de literatos, discutia-se, certa vez, metrificação, quando um deles procurou amesquinhar Machado de Assis, observando, leviano:
- Era um péssimo poeta. O último verso dos alexandrinos A uma criatura tem onze sílabas; é um verso de pé quebrado.
Emílio de Menezes que se achava no grupo, e sentia uma religiosa admiração pelo Mestre, franziu a testa profética e protestou soturno:
- Não pode ser.
E sentencioso:
- Os bons versos não têm pés: têm asas!
DIREITO DE SER INFELIZ
Alberto Faria - Conferência ao Museu Histórico Nacional, a 13 de maio de 1924
Exercia Luiz Gama, o famoso apóstolo negro, a advocacia e o seu apostolado contra a escravatura em São Paulo, quando lhe entrou pelo escritório, aflito, um negro, o qual, apresentando o seu pecúlio, lhe pedia que lhe promovesse a libertação. Minutos depois entra o senhor do escravo que, ao ver o negro, foi exclamando:
- Mas por que isso! Que mal te fiz eu? Pois eu não te trato como filho? Não tens cama, comida e dinheiro? Queres, então, deixar o cativeiro de um senhor bom, como eu, para seres infeliz em outra parte? Que te falta lá em casa? Anda! Fala!
O negro ofegante e cabisbaixo, calava-se.
- Falta-lhe o principal, - interveio, irônico, Luiz Gama.
E dando uma palmada amiga no ombro do homem da sua cor:
- Falta-lhe a "liberdade de ser infeliz" onde e como queira!
Fonte: Humberto de Campos. O Brasil Anedótico (1927).

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