terça-feira, 4 de janeiro de 2011

COMISSÃO DE SAÚDE: OAB-CE versus CREMEC

Nos últimos meses, a mídia cearense, notadamente jornais e emissoras de televisão, tem cedido os seus preciosos espaços, mormente quando há uma certa carência de matérias de maior impacto, para “cobrir” os trabalhos de uma Comissão de Saúde, instituída no âmbito da Seção Ceará da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-CE), com o propósito velado de revelar o “caos” da saúde imperante nesta Terra da Luz.
A Comissão em epígrafe apóia-se, mais fortemente, na presença de profissionais de formação cruzada, de médicos, de reconhecida competência em suas especialidades de atuação, que se bacharelaram em Direito, passando a ter uma dupla militância profissional, por vocação, interesse ou conveniência.
No entanto, ao que se percebe, até o momento, o citado grupo de trabalho tem centrado o seu foco na rede de hospitais públicos, consistindo o labor, fundamentalmente, de meras visitas às instituições hospitalares, acompanhadas de repórteres e cinegrafistas, que tratam de documentar as filas de espera, para atendimento médico-hospitalar, o que rende notícias e, naturalmente, dividendos midiáticos.
Pautar a avaliação da Saúde, ou do Sistema Único de Saúde, com base em hospital, configura uma visão reducionista da questão, ao cingir-se a apenas uma faceta, de uma área abrangente e complexa, que tem, realmente, sérios problemas, muitos dos quais produzidos fora do Setor Saúde, como a Economia e a Educação, cujos efeitos danosos transbordam, repercutindo na Saúde da população.
Por essa ótica, identificando pacientes em corredores ou constatando listas de espera, o Sistema Nacional de Saúde da Inglaterra, de caráter universalista e considerado modelo de eficiência, seria execrado, porquanto os súditos da rainha Elisabeth II aguardam, pacientemente, meses, e até mais de um ano, para se submeterem a alguns procedimentos médicos mais sofisticados, a exemplo das próteses. É bem verdade que a ordem da fila é devidamente observada, tendo em conta critérios técnicos e a cronologia de admissão, já que lá não há o popular “jeitinho” brasileiro.
A aferição da Saúde conduzida por outra entidade de classe, não representativa de qualquer categoria profissional da saúde, é interpretada, por muitos colegas médicos, como uma ingerência indébita de organismo estranho, ou mesmo, para os causídicos, significar que a OAB-CE plana em céu de brigadeiro, sem mazelas a afetar as atividades dos seus afiliados. Não se deve, contudo, rechaçar o ato normativo que criou a dita Comissão, cujo fulcro poderia ser de valia, caso ela se detivesse, aproveitando a conhecida expertise de seus componentes, a esmiuçar a análise em áreas de interface, do Direito e da Medicina, a exemplo da “Judicialização da Saúde” e da crescente onda de processos contra possíveis erros médicos.
Por uma questão de cordialidade e de reciprocidade, para com a OAB-CE, o Conselho Regional de Medicina do Estado do Ceará, ciente dos sérios e atávicos problemas da prestação de serviços jurídicos aos cidadãos, traduzidos em lentidão e inoperância da máquina jurisdicional e em cerceamento de direitos a milhões de brasileiros, que redundam em comprometimento ao estado de saúde das pessoas, bem que poderia considerar a instituição formal de uma “Comissão Jurídica”, composta de médicos já calejados de exercitar a arte hipocrática em condições de adversidade, para diagnosticar e tratar os transtornos jurídicos.
Prof. Dr. Marcelo Gurgel Carlos da Silva
Da Academia Cearense de Medicina
* Publicado In: Conselho, 84: 6, 2010. (Informativo do Conselho Regional de Medicina do Estado do Ceará).

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