sábado, 7 de janeiro de 2012

O DIA EM QUE O CEARÁ PAROU

Por Ricardo Alcântara (*)
3 de janeiro de 2012 será lembrado por um tempo como o dia em que o estado do Ceará baixou as portas. Fechou. E ficou o sentimento de que seu governo não foi competente para evitar que as coisas chegassem a tal ponto.
Às três da tarde, quem trafegava pelas principais avenidas da capital já percebia o alcance do pânico: lojas com portas cerradas e multidões de trabalhadores nos pontos de ônibus, indo se esconder dentro de casa.
O pânico tomou conta também das (até alguns anos atrás) pacatas cidades do interior, onde, recentemente, já houvera explodido os índices de violência e de consumo de drogas. No medo das pessoas, a força da greve.
A incapacidade de diálogo do governo, já demonstrada durante a greve dos professores, garantiu à dos policiais máxima adesão e a cidade ficou entregue à própria sorte. Na prepotência do governo, o combustível da greve.
O governo tratou com negligência as reivindicações dos policiais e fez péssima avaliação sobre o potencial do movimento. Não seria correto, agora, conferir responsabilidade somente aos policiais que se retiraram das ruas.
A mobilização de instituições, sociais e autônomas, por uma mediação foi reveladora de como o governo perdeu rapidamente as condições de resolver o impasse com seus servidores. Por um dia, nos governou somente o caos.
O governo ficou sem discurso. Perdeu a voz, perplexo com a descoberta súbita de sua impotência, iludido que estava sobre o ilimitado alcance de sua vontade – nada soberana, como foi forçado a se dar conta tardiamente.
E o estado lá, cidade por cidade, entregue ao pânico. E por quê? Porque o governo deu ao movimento grevista todas as credenciais para expor sua máxima irresponsabilidade sob um manto aceitável de indignação.
Aquela imagem de esposas de policiais secando os pneus das viaturas disse tudo: a adesão das famílias deu ao extremismo dos grevistas um teor de humanidade que só os mais incompetentes governos concedem à desordem.
O governo não exercitou a tolerância no limite necessário para convencer a sociedade de que toda a irresponsabilidade estava do outro lado. O que se viu? Um governo mudo, desprovido de um discurso competente para a crise.
Crise que demonstrou, sem retoques, o grau de liderança do Secretário de Segurança e seu controle sobre a tropa: zero vírgula zero. O governo negociou mal, expôs o comando ao esvaziamento súbito e deverá substituí-lo.
Convocado para a missão como um “pé de boi” – conhecedor das rotinas do quartel e traquejado no trato com a tropa – o que se revelou sobre Francisco Bezerra foi que nem disso, o singelo feijão com arroz, soube dar conta.
Dizer que as partes entraram em acordo não retrata os fatos: o governo foi submetido a uma rendição. Outra versão seria desproporcional à distância deixada entre a intransigência inicial e os termos finais admitidos.
O dia será lembrado como aquele em que o autoritarismo governamental, até então protegido pela couraça de uma aliança partidária de coerência duvidosa, revelou toda a sua fragilidade. Coube à sociedade demonstrá-lo.
A hora de mostrar a cara
Ora! Não importa se foram 1,5 milhões de pessoas ou somente umas 300 mil que vaiaram a prefeita nos minutos finais do ano velho: de um jeito ou de outro, era gente demais e eles o fizeram no melhor da festa.
Ela estava lá, exposta àquilo desnecessariamente, e o fato deveria, sim, ajudá-la a corrigir o foco entre o que imagina e aquilo que vê.
(*) Jornalista e escritor. Publicado In: Pauta Livre.

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