segunda-feira, 28 de julho de 2014

POLITICAMENTE CORRETO

Affonso Taboza (*)

País dos modismos, o Brasil. Não sei se nisso somos diferentes de outros povos. Pouco importa. Cabe-nos analisar o que nos toca e a forma como as coisas acontecem em nosso chão. Verdade é que, nos últimos tempos, muitos conceitos aqui arraigados viraram de ponta-cabeça, afetando o modo de pensar e, em consequência, atitudes e ações de grande parte do nosso povo. Certo? Errado? Cada um tem sua verdade... Avanço? Atraso? Cada um tem sua ótica...
Uma coisa não se pode negar: São estranhos, muito estranhos, certos comportamentos e formas de pensar correntes hoje em dia, se comparados aos conceitos e atitudes de vinte ou trinta anos atrás.

Um exemplo forte é a questão racial. Hoje, chamar-se alguém de negro, simplesmente apelando para uma realidade física visível, é ofensa grave. Por quê? O termo negro é palavrão? É indigno ter a pele escura?
Chamar alguém de negro, hoje, é mais grave que chamar de ladrão, ou qualificar de forma indecorosa sua honrada mãe. Diferente de tempos bem recentes, quando as expressões “negro velho” ou mais comumente “nego véi”, eram formas amistosas e até carinhosas de trato. De igual modo, “minha nega”. Era comum maridos tratarem as esposas por “minha nega” ou “minha veia”. Vá alguém tratar hoje um semelhante com tais termos... Se a “ofensa” for levada à Justiça, pode o atrevido ir parar na cadeia, visto que os juízes não têm ainda o poder de mandar alguém para o fogo do inferno.

O rolo compressor dos revisionistas é tão grande que até a obra de Monteiro Lobato, ícone da literatura brasileira que fez a alegria de gerações de petizes, é policiada e taxada de racista pelas autoridades deste governo de poucas luzes e muitos preconceitos. Tende a entrar, se não já entrou, no Index Librorum Proibitorum. E lembre-se que o escritor viveu em época em que ser negro era condição natural de herança étnica e, portanto, pessoas de pele escura não se sentiam ofendidas com isso. A obra foi produzida naquele contexto, mas os doutos de Brasília são incapazes de sentir isso.
Num mundo de tanta hipocrisia e simulação, qualificar alguém de negro é ofensa. “Politicamente correto” é designá-lo de afro-descendente. O que dá no mesmo. Babaquice sem tamanho!

Aprendemos em tempos idos que o Brasil era um país de brasileiros, onde não havia distinção de cor e credo. Pelo menos do ponto de vista legal. Consequência natural da mistura de raças e origens do seu povo. Um pais de mestiços, onde são raros os que portam sangue europeu puro. Por trás de uma pele alva, corre com frequência boa dose de sangue índio, africano ou asiático. Nunca tal fato foi motivo de querela ou questionamento, nem despertou atenções.
O politicamente correto e os eufemismos desnecessários dos dias de hoje jogam holofotes em tal questão, sem nenhuma vantagem para o País. Levantam discussões, exacerbam ânimos, abrem feridas. Um tiro no pé. Destruíram a boa convivência, institucionalizaram o racismo. Um racismo às avessas onde “brancos” são discriminados.

Hoje o Brasil é um país de falsos brancos, falsos índios, falsos afro-descendentes, falsos asiáticos. Um país de eufemismos.
 (*) Membro do Instituto do Ceará
Fonte: O Povo, Opinião, de 23/07/14.

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