domingo, 22 de fevereiro de 2015

COCEIRA FUTEBOL CLUBE

Batista de Lima (*)

Está comprovado que o clube de futebol que possui o maior número de jogadores é o Coceira Futebol Clube. Já não é nem mais um clube, já é uma irmandade internacional. São poucos os jogadores que não pertencem a esse conglomerado de atletas. É muito fácil identificar aqueles que fazem parte do Coceira. Basta aproximar um microfone do atleta que ele vai logo se identificando. Se ele se coçar, e quase sempre acontece, é porque pertence ao Coceira Futebol Clube.
O Coceira, como é vulgarmente chamado, não possui sede nem diretoria, nem estatuto. E pior, não possui nem torcida, mas é o maior clube do mundo e sai dos gramados, passa pelas salas de entrevistas, entra pelos canais de comunicação e invade nossas casas a qualquer hora, com tanta coceira que já há muito torcedor contaminado com a moda de se coçar atleticamente. Já é comum encontrar em reuniões sociais, pessoas, homem, principalmente, que se coçam como se atletas fossem.
Já foram consultados até cientistas de renome ao lado de pangarés do pensamento, mas não se chegou ainda a uma conclusão convincente e única sobre o fenômeno. Um psicólogo quase alcoólatra chegou a afirmar que é tudo uma questão de nervosismo. Disse que, segundo Lacan, esse tipo de manifestação externa é a metáfora, o sintoma de uma realidade interna que o atleta não revela. Essa teoria foi contestada por um atleta amador, segundo o qual, no seu tempo de atividade futebolística, ele se coçava por causa de um tipo de mucuim de grama.
Essa teoria, em seguida, foi contestada pelos torcedores do futsal. Afinal os atletas de quadra também se coçam e não têm contato com grama. Uma dona de casa e mãe de 14 meninos concluiu, na pesquisa, que é tudo uma questão de sujeira. Segundo ela, quando o suor aflora, tudo que é piolho, lêndea, pixilinga e pulga começam a se movimentar incomodados e se vingam no couro cabeludo do coitado do atleta. Ao seu lado uma vizinha, disse que, no caso, era só usar Neocid, que matava tudo.
Fato é que já há um pesquisador de universidade estrangeira, propenso a pesquisar para tese de doutoramento o real motivo de tanta coceira. Acha ele que essa mania é infecciosa pois já há muita gente, fora das quatro linhas do profissionalismo, com esse sestro incorrigível. Já flagraram um coronel se coçando em plena solenidade de formatura, um cardeal em celebração religiosa e um faquir que de tanto se coçar, esqueceu a cobra e foi mordido por ela.
Fato é que a grande imprensa já olha de trivela para o fenômeno, pelo medo da contaminação em repórteres e cinegrafistas. Os otorrinos estão “lavando a burra” com esse surto, pois a mania de coçar o ouvido com o dedo mindinho termina por transformá-lo em cotonete e empurrar o cerol do ouvido para os tímpanos, o que leva à necessidade de limpeza médica. É grande a presença de atletas nessas clínicas com problemas de audição. Prova é que, em campo, às vezes, o juiz apita e alguns não ouvem nada.
Um cientista europeu embrenhou-se nos rincões da África e apoiando-se nas teorias evolucionistas de Darwin concluiu que a origem de toda a coceira humana é proveniente dos nossos ancestrais macacos. Depois afirmou que o crescimento do futebol africano e a consequente exportação dos seus melhores atletas fez com que a coceira ancestral se disseminasse no mundo inteiro como um prognóstico da aldeia global definitiva em que estamos. O coitado foi preso por racismo e essa teoria já foi posta em prática por alguns torcedores que estão sendo processados ou presos.
Finalmente, pode-se dizer que a polêmica sobre o assunto vai durar muito ainda. Para o torcedor, no entanto, não importa se o jogador se coça, se tira a camisa quando faz o gol, para melhor se coçar e espantar os mucuins. Fato é que a coceira existe e é real. Mesmo depois do banho nos intervalos e nos finais de jogo, ela continua atazanando os atletas. É tanto que já estão inventando um sabonete especial, acompanhado de um xampu antisséptico que vai ser o fim da coceira. Para especialistas em marketing, isso é apenas jogada comercial, afinal, não há nada escrito nos códigos do Direito que proiba alguém de se coçar, isso desde o bicho de pé, passando pela frieira, coçar-se pode se transformar num gostoso prazer.
(*) Professor da Unifor e da Uece e membro da Academia Cearense de Letras.
Fonte: Diário do Nordeste/Caderno3, de 6/01/2015.

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