terça-feira, 10 de fevereiro de 2015

ELEIÇÃO ACADÊMICA, AS CRÍTICAS E O PRESENTE

Por João Soares Neto
No próximo dia 10 deste fevereiro, a Academia Cearense de Letras, a mais antiga das academias brasileiras, realizará sessão eleitoral para preencher a vaga aberta com a perda do grande poeta, ensaísta, professor e cidadão Artur Eduardo Benevides. São quatro os candidatos.
Esta introdução serve apenas para analisar artigo de Mário Sérgio Conti, jornalista e escritor, sob o título “Conformismo e coonestação”, publicado em 28 de novembro de 2014, em que critica a Academia Brasileira de Letras, a maior e a mais bem aquinhoada em nomes e prendas.
Ele começa dizendo: “A desimportância da Academia Brasileira de Letras emudeceria até Lobão (refere-se ao cantor, grifo meu). Ninguém liga para ela, exceto os 40 autoproclamados imortais. Que eles desfrutem em sossego do privilégio de se fantasiarem de fardão pela eternidade afora”.
Uma primeira observação: por que Mário Sergio Conti não emudeceu. Se ninguém liga para ela, qual o sentido e a razão de seu artigo tão candente?
Ele argui, em seguida: “A Academia é um clube cujos sócios, em graus variados de senectude, se reúnem para tomar chá e trocar dois dedos de prosa acerca de seus sublimes antecessores”. Não precisa ter lido Freud, Jung ou Melanie Klein, para ver réstias de ressentimento explícito em cada frase do articulista.
Ele continua: “É perda de tempo criticar a Academia. Não importa que ela sobreviva à sombra do Estado. Que jamais tenha emitido um sussurro contra a censura e os outros paus-de-arara na vida cultural”. E aduz: Que cultive a mediocridade literária (Nélida Pinõn, Murilo Melo Filho etc.) e a bajulação de poderosos (Fernando Henrique Cardoso, Marco Maciel etc.). Ninguém liga”.
Claro que alguém liga. Ele próprio, Conti, está ligando e dando cavaco. Qual a razão desse seu artigo grave?
Mais lá na frente, passo para evitar detalhes menores, ele se contradiz, ao afirmar: “A Academia só deixa de ser inócua quando nela entra um poeta de verdade. Isso é chato porque as más companhias têm influência e a instituição os diminui individualmente: todos os ratos são pardos no Petit Trianon” (nome da sede da ABL).
Ele está falando do poeta Ferreira Gullar e acrescenta texto do próprio vate maranhense: “A Academia já fez tudo para eu entrar lá, e eu digo: não. Jamais entrarei para a Academia... Como eu não tenho cabeça acadêmica, como não é a minha, não vou entrar lá”.
Parêntesis meu: Ferreira Gullar entrou na ABL em dezembro do ano passado.
Sem esquecer que havia elogiado Gullar (poeta de verdade, ele disse), mais a frente, muda de ideia e o ataca: “Nem sempre conseguiu o que buscava. Seus poemas são às vezes discursivos ou demagógicos; o credo stalinista o fez tropeçar; seus versos perderam voltagem com a passagem do tempo”. Em seguida, elogia: “O resultado final, porém, é largamente positivo. Pelo que sua poesia tem de inventividade formal e insubmissão”.
Como se vê, há um “morde e assopra” no escrito de Mário Sérgio Conti sobre a entrada na ABL de Ferreira Gullar, o autor, entre outros, do “Poema Sujo”.
Como afirmou Tchekhov, escritor russo: “De inveja fica-se estrábico”. Por outro lado, está claro que as academias brasileiras, sejam de letras, ciências e artes, precisam repensar seus desígnios. Mudar e evoluir, ter a coragem de ajustar-se ao tempo em que vivem, às mudanças definitivas dos processos anacrônicos de escolhas de novos candidatos (por que não um debate entre os candidatos? por que não uma prova de conteúdo?), dos seus modelos de gestão em que só o presidente faz tudo. Isto não é desrespeitar a tradição, mas ter coerência com o tempo em que se vive.
Sem menosprezar a tradição e os costumes, incorporar o que há de saudável e lógico nestes tempos em que antigo passa a ser tudo aquilo substituído pela voragem da inovação. A senectude, a que se refere Conti, não é a idade dos componentes, mas a permanência de métodos e ações que já não mais fazem sentido e pouco produzem resultados efetivos.
João Soares Neto é escritor e membro da Academia Cearense de Letras.
Sexta-feira, 06 de fevereiro de 2015 

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